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STF dá sinais de que ultrapassa sua função jurisdicional

  • Martin Smith de Oliveira Martins
  • há 6 dias
  • 6 min de leitura

Autor: Martin Smith de Oliveira Martins

 

São Paulo

2025


  Diante da crescente judicialização da política, o Supremo Tribunal Federal vem sendo chamado a atuar, cada vez mais, em casos que dizem respeito a pautas de interesse dos outros poderes da república. Entretanto, a atuação da corte causa polêmicas e gera questionamentos quanto à possibilidade de o tribunal estar interferindo nas funções dos outros poderes, de modo a estabelecer uma ‘moderação’ no que diz respeito ao relacionamento das instituições. Estaria o pretório excelso apenas exercendo o controle de constitucionalidade referente a casos que, devido ao momento político nacional, tomaram excepcional proporção? Poderia a corte suprema estar ‘transbordando’ a função jurisdicional a ponto de ter se transformado em um ‘novo poder moderador’?


Em artigo publicado no jornal “O Estado de São Paulo”, no dia 21 (vinte e um) de junho de 2019 (dois mil e dezenove), o jurista Gabriel Heller explica que, antes de realizar tal discussão, é necessário ter a clareza de que o poder moderador existia no império, sendo que a constituição da época previa a existência de quatro poderes.[1]

Já a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (mil novecentos e oitenta e oito)[2], não se encarregou de consolidar tal função. À corte suprema foi conferida a prerrogativa de exercer o controle de constitucionalidade, como previsto no inciso I do artigo 102 da Constituição Federal2, por meio de ações diretas de inconstitucionalidade ou ações declaratórias de constitucionalidade.[2] Essa função é essencial para a delimitação das competências dos poderes. Exerce, portanto, o Supremo Tribunal Federal um papel limitador.


De volta ao texto, Gabriel Heller apresenta o comando do caput do artigo 102, segundo o qual: “Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da constituição...”.[3] Percebe-se que a função jurisdicional da corte suprema lhe garante a possibilidade de limitar atos hipoteticamente inconstitucionais de outros poderes, mas não de moderar a atuação desses. A questão é: Estaria o Supremo Tribunal Federal agindo como poder moderador e, consequentemente, ultrapassando sua função jurisdicional constitucionalmente atribuída?


O autor do artigo ressalta que alguns acreditam ser função da corte máxima do país ter uma postura menos conservadora (no que se refere à conservação do texto constitucional na forma como originariamente posta), entretanto, adverte que tal prática abre caminho para que a corte: “usurpe competências e decida em descompasso não só com a maioria ocasional, mas também com a constituição.”[4]


O ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Cláudio Lamachia, afirmou, em sessão solene da abertura do ano judiciário de 2019 (dois mil e dezenove), que o judiciáio se transformou em “poder moderador”.[5] Em um primeiro momento, não houve citação direta ao Supremo Tribunal Federal na fala do advogado, mas, sim, um aviso geral para o poder julgador. A posição do ex-mandatário da Ordem dos Advogados do Brasil é relevante e interessante porque atribui a recente tendência (de aumento do protagonismo judicial) ao desgaste político, e não ao judiciário em si, apesar de reconhecer que o poder da república: “extrapolou sua circunstância institucional.”[5]

 

Fez, então, o, àquela altura, representante maior da classe dos causídicos menção à mais alta corte do país:[5]

 

O desgaste do poder político configurou esse protagonismo, inédito e não postulado, mas ao qual não pôde recusar. Jamais o STF foi tão demandado, se transformando em muitos momentos em tribunal penal, que não é sua vocação nem sua destinação. O ano judiciário de 2019 será rico em mudanças, debates e reformas.[5]

 

A tese de que o judiciário, especialmente o Supremo Tribunal Federal, possa exercer papel de “poder moderador” foi reforçada ao ser vocalizada, em julho de 2020 (dois mil e vinte), pelo então presidente do sumo areópago, Dias Toffoli:[6]

 

Sempre há um editor. O editor virá a ser o Poder Judiciário, se houver um conflito e ele for chamado. E o Judiciário não tem a possibilidade de dizer 'isso eu não julgo', nós temos de julgar. Enquanto Judiciário, enquanto Suprema corte, nós somos editores de um país inteiro.[6]

 

Em 2011 (dois mil e onze), o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, Moreira Alves, concedeu entrevista e traçou uma comparação entre o tribunal de seu tempo e o daquela época, em que constatou: “Hoje, o STF está adotando uma posição mais política do que antigamente”[7]. Abordou a questão do que pode ser considerado uma interferência da corte em outros poderes: “Esse é o tal problema... Ao se elaborar uma lei ou ao se indicar quando ela será aplicada, se conduz a um poder político de dizer: ‘A normatividade é essa’.”[7] Acrescentou um questionamento quanto à missão original do tribunal: “O problema aí é saber justamente se a constituição outorga esse poder ou se ele foi criado pelo tribunal”.[7]


Para o professor Ives Gandra da Silva Martins, recentemente, o Supremo Tribunal Federal vem atuando de maneira ativista e entrando em conflito de competência com os outros poderes:[8] 

 

Apesar de achar que há uma mudança de posição, eu tenho admiração pelo conhecimento jurídico deles. Mas acho que estão trabalhando como ativismo judicial que não se justifica. A constituição foi muito clara, a maioria deles não participaram do processo Constituinte, eu fui constantemente convidado. O que nós discutimos era que não podemos ter um poder superior ao outro na Constituinte. Ao meu ver, eles passaram a invadir as competências dos Legislativos e Executivo. Isso eu não concordo.[8]

 

O ex-ministro daquela casa, Cezar Peluso, apresenta uma visão similar à do ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Cláudio Lamachia. A tendência de expansão do STF em relação aos outros poderes não seria a corte se aproximando de um “poder moderador”, mas, sim, o caminho que está sendo provocada a trilhar, devido à realidade política do país e que a leva para uma atuação que não é sua vocação.[9]

 

Aspas para a matéria do sítio eletrônico Consultor Jurídico:[9]

 

De acordo com o magistrado, não cabe ao Supremo ‘fazer uma fiscalização da vida política’, afastando parlamentares ou impedindo a nomeação de ministros. A seu ver, essa atuação compromete as funções essenciais do STF e enfraquece as instâncias políticas.[9]

 

Conclusão

 

Considerando as fontes abordadas e a realização da reflexão necessária, é a conclusão a que se chega: Apesar de não ser possível afirmar que o Supremo Tribunal Federal tenha se tornado um novo “poder moderador”, por não ser exclusivamente sua a função constitucional de observar a harmonia entre os poderes (uma vez que esse equilíbrio depende de atuação conjunta das instituições)[2], existe um conflito de competências político-constitucional capaz de revelar que a corte vem dando sinais de estar ‘transbordando’ e ‘ultrapassando’ a sua função jurisdicional.

 

Referências Bibliográficas:

 

[1] ATIVISMO do Supremo Tribunal Federal enfraquece sistema político, diz Cezar Peluso. Conjur.com.br, 2020. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-out-16/ativismo-stf-enfraquece-sistema-politico-cezar-peluso. Acesso em: 24 set. 2025.

 

[2] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 2021. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 24 set. 2025.

 

[3] HELLER, Gabriel. O poder moderador no século XXI: o judiciário que reina e governa. Estadodaarte.estadao.com.br, 2019. Disponível em: https://estadodaarte.estadao.com.br/o-poder-moderador-no-seculo-xxi-o-judiciario-que-reina-e-governa/. Acesso em: 24 set. 2025.

 

[4] PARA jurista Ives Gandra, STF age com ativismo judicial ‘que não se justifica’. Jovempan.com.br, 2021. Disponível em: https://jovempan.com.br/programas/direto-ao-ponto/para-jurista-ives-gandra-stf-age-com-ativismo-judicial-que-nao-se-justifica.html. Acesso em: 24 set. 2025.

 

[5] PRESIDENTE da OAB diz que judiciário se transformou em “Poder Moderador”. Jusbrasil.com.br, 2019. Disponível em: https://stf.jusbrasil.com.br/noticias/670223279/presidente-da-oab-diz-que-judiciario-se-transformou-em-poder-moderador. Acesso em: 24 set. 2025.

 

[6] STF está adotando posição mais política. Conjur.com.br, 2011. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2011-ago-23/stf-adotando-posicao-politica-antes-moreira-alves. Acesso em: 24 set. 2025.

 

[7] SUPREMO e judiciário atuam como “editores” do país, diz Dias Toffoli. Conjur.com.br, 2020. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-jul-28/dias-toffoli-stf-nao-abandonar-combate-fake-news. Acesso em: 24 set. 2025.

 


Citações no texto:

 

[1] HELLER, Gabriel. O poder moderador no século XXI: o judiciário que reina e governa. Estadodaarte.estadao.com.br, 2019. Disponível em: https://estadodaarte.estadao.com.br/o-poder-moderador-no-seculo-xxi-o-judiciario-que-reina-e-governa/

[2] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, 2021. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

[3] HELLER, Gabriel. O poder moderador no século XXI: o judiciário que reina e governa. Estadodaarte.estadao.com.br, 2019. Disponível em: https://estadodaarte.estadao.com.br/o-poder-moderador-no-seculo-xxi-o-judiciario-que-reina-e-governa/

[4] HELLER, Gabriel. O poder moderador no século XXI: o judiciário que reina e governa. Estadodaarte.estadao.com.br, 2019. Disponível em: https://estadodaarte.estadao.com.br/o-poder-moderador-no-seculo-xxi-o-judiciario-que-reina-e-governa/

[5] PRESIDENTE da OAB diz que judiciário se transformou em “Poder Moderador”. Jusbrasil.com.br, 2019. Disponível em: https://stf.jusbrasil.com.br/noticias/670223279/presidente-da-oab-diz-que-judiciario-se-transformou-em-poder-moderador

[6] SUPREMO e judiciário atuam como “editores” do país, diz Dias Toffoli. Conjur.com.br, 2020. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-jul-28/dias-toffoli-stf-nao-abandonar-combate-fake-news

[7] STF está adotando posição mais política. Conjur.com.br, 2011. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2011-ago-23/stf-adotando-posicao-politica-antes-moreira-alves

[8] PARA jurista Ives Gandra, STF age com ativismo judicial ‘que não se justifica’. Jovempan.com.br, 2021. Disponível em: https://jovempan.com.br/programas/direto-ao-ponto/para-jurista-ives-gandra-stf-age-com-ativismo-judicial-que-nao-se-justifica.html

[9] ATIVISMO do Supremo Tribunal Federal enfraquece sistema político, diz Cezar Peluso. Conjur.com.br, 2020. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-out-16/ativismo-stf-enfraquece-sistema-politico-cezar-peluso

 
 
 

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